segunda-feira, 4 de maio de 2020

A FORMAÇÃO DOS ENGENHEIROS ELETRICISTAS DO CEFET-MG E OS DESAFIOS DA FORMAÇÃO HUMANISTA E CRÍTICA


Trabalho apresentado no XXXII Congresso Latino Americano de Sociologia – ALAS-2019 (GT 23 LT. 05)

Antônio TOMASI [1]
Mislene ROSA[2]
Ma. Bárbara de CAMPOS[3]

Resumo
Segundo o Conselho Nacional de Educação do Brasil, a formação do engenheiro deve ser também humanista e crítica, capacitando-o a identificar e a resolver problemas, visando atender às demandas da sociedade. O estágio supervisionado, que acontece no final do curso, é um momento privilegiado da formação, quando os estagiários devem aplicar e aprimorar seus conhecimentos e habilidades junto às empresas, e de aferição destas capacidades, objetivo deste estudo. Em um mundo do trabalho cada vez mais competitivo e excludente e em uma sociedade marcada pela crescente miséria e desigualdade social, a formação humanista e crítica se faz presente na atuação dos estagiários? Durante um semestre, 45 alunos do curso de engenharia elétrica do CEFET-MG expuseram e exemplificaram para os seus colegas e pesquisadores sua atuação nos estágios que, segundo eles próprios, demonstram suas capacidades: identificam teórica, técnica e cientificamente as atividades da empresa; aprendem rapidamente a executar as tarefas; superam dificuldades; se antecipam aos problemas; são proativos, criativos e trabalham em equipe; têm o sentido de urgência, habilidades de gestão e comportamentais. Observa-se, todavia, que as capacidades que afirmam possuir atendem prioritariamente aos próprios interesses (empregabilidade e mobilidade profissional) e aos das empresas (competividade e crescimento). E, ainda, que eles compartilham os valores do mercado e a realidade social lhes parece distante e naturalizada. De certo, a atuação dos estagiários não é construída apenas no curso, mas este pode não conferir relevância à formação humana, crítica e socialmente comprometida.

Palavras chave: Estágio supervisionado; Formação do engenheiro; Formação humana e crítica; Capacidades do engenheiro eletricista.



1.     INTRODUÇÃO
O estágio supervisionado na universidade brasileira é obrigatório e busca articular o ensino teórico/prático por ela oferecido em suas salas de aula e laboratórios e a experiência oferecida pelo mundo do trabalho, na forma de participação na resolução de problemas reais encontrados pelas empresas e outras organizações assemelhadas. Tutorados por profissionais da área e acompanhados pelos professores de suas instituições de ensino, os estagiários podem testar, aplicar e aprimorar seus conhecimentos e habilidades. Encontra-se aí uma fórmula antiga de formação profissional assegurada pelas escolas e não apenas nos cursos de engenharia.

A estrutura curricular dos cursos de engenharia, assim como de outros cursos superiores e mesmo técnicos, mantém, ao lado de disciplinas básicas e técnicas, disciplinas das áreas de humanas, sociais e filosóficas, tais como psicologia, sociologia e filosofia. Tais disciplinas, ainda que ofertadas numa carga horária bem inferior às das demais disciplinas básicas e técnicas, seriam as responsáveis pela formação humanística dos jovens futuros engenheiros, assim como bem determina o Conselho Nacional de Educação – CNE. Segundo este órgão governamental a formação do engenheiro deve ser humanista e crítica, capacitando-o a identificar e a resolver problemas, visando atender às demandas da sociedade.

Está, portanto, explicitada a preocupação deste organismo no sentido de que, na formação do engenheiro e no seu exercício profissional, o domínio de habilidades técnicas não se sobreponha à sua responsabilidade social e humana.

2.    PROBLEMÁTICA

2.1.         Formação Humanista e Crítica de Engenheiros

Em um mundo cada vez mais complexo, seja social, econômica, politica ou culturalmente é compreensível a preocupação do Conselho Nacional de Educação – CNE brasileiro quanto à formação dos engenheiros, profissionais que vivem quotidianamente as rápidas e inúmeras mudanças sofridas pelo mundo do trabalho com o desenvolvimento mundial de novos produtos, serviços, meios de comunicação e processos.

Mas a teoria na prática parece ser bem diferente, pelo menos se tomarmos como referência pesquisa realizada por Boina, 2011, no Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais – CEFET-MG que mostra muito claramente que as disciplinas que deveriam fortalecer a dimensão humanística da formação dos jovens futuros engenheiros do CEFET-MG não apenas têm uma carga horária inferior às das outras áreas, como era de se esperar, mas não têm o reconhecimento adequado dos alunos, dos professores e da coordenação do curso. Todos eles acreditam que as disciplinas possam contribuir para uma formação mais completa e humanística dos futuros engenheiros, todavia, os alunos não veem como isso possa acontecer e os professores e coordenadores as veem no currículo muito mais pelo fato de serem obrigatórias.

Os professores das referidas disciplinas podem ser também responsáveis pelo descrédito delas junto à comunidade acadêmica. A pesquisa mostra que eles oferecem o curso de sociologia de forma completamente teórica e com a mesma referência bibliográfica clássica oferecida nos cursos superiores de ciências sociais, ou seja, não contextualizado com a realidade do mundo da engenharia, o que pode explicar a dificuldade dos alunos em articular os problemas da engenharia e seu contexto político e social com as bases teóricas sociológicas que lhe são oferecidas.

Não se pode, contudo, creditar apenas às disciplinas das áreas de humanas e sociais a responsabilidade pela formação humanista e crítica dos futuros engenheiros, como estabelece o CNE.  De certo, a família ou o grupo social no qual se encontra inserido o futuro engenheiro pode ser uma referência importante neste sentido, além, e muito especialmente, do papel que exerce os seus professores na sua formação, inclusive os do curso de engenharia. Nestes casos, as diversas relações estabelecidas pelo jovem futuro engenheiro podem se restringir a uma leitura limitada dos fenômenos sociais e humanos que os cercam. Carente da compreensão e da explicação que oferecem as teorias sociológicas sobre os fenômenos sociais, políticos e mesmo humanos, ele poderia se tornar refém da opinião, um importante obstáculo epistemológico, como remarca Bachelard (2001), no desenvolvimento do seu espírito científico e da produção do conhecimento.

Tarefa difícil, contudo, é detectar no estagiário se o seu comportamento apresentado no exercício de suas atividades na empresa se deve à escola, a seus professores, à sua família ou ao seu grupo social. É muito possível, também, que esse comportamento seja adquirido no próprio estágio a partir dos relacionamentos aí estabelecidos, em especial com os tutores, o que dá uma especial relevância ao estágio. Muito seguramente se deve a tudo isso, talvez mais a um do que a outro, todavia o mais interessante seria perguntarmos se em um mundo do trabalho cada vez mais competitivo e excludente e em uma sociedade marcada pela crescente miséria e desigualdade social, a formação humanista e crítica se faz presente na atuação dos/as estagiários/as?

A questão expõe muito nitidamente uma preocupação e mesmo um entendimento sobre uma formação cidadã do engenheiro, uma formação para além de técnica, que seja social e humanamente comprometida com o outro, com o meio ambiente e o futuro do planeta. Essa formação pode ser depreendida do próprio entendimento do CNE, que nos conduz ao entendimento de que as atitudes dos engenheiros expressas na posse de um saber ser são fundamentais. Não se trata aqui, portanto, de se questionar sobre uma formação que atenda ao mercado que se defronta permanentemente a mudanças que exigem também que novas atitudes do trabalhador sejam desenvolvidas para responder a essas demandas, relacionadas à flexibilização dos processos produtivos e das relações de trabalho, ainda que elas possam ser consideradas importantes no contexto competitivo da sociedade capitalista. Tanto a questão proposta quanto a questão não proposta tratam, em última instância, do saber ser do trabalhador, em outras palavras, de uma dimensão subjetiva da ação do trabalhador até então não reconhecida no modelo da qualificação, cuja inspiração taylorista não abria espaço para tal, mas reclamada pelo modelo das competências, cujos estudos mostram oscilar entre atender os interesses dos trabalhadores e os dos empregadores.

Ainda que essa subjetividade não fosse desconhecida da sociologia do trabalho (NAVILLE, 1956) ela ganha relevância com a emergência do modelo das competências que coloca em questão as relações de trabalho na indústria siderúrgica francesa e força o conhecido Accord sur la Conduite de l’Activité Professionnelle  ACAAP – 2000, assinado em 1990. A academia contribui com o debate em torno desta nova noção ao acrescentar ao saber e ao saber-fazer, que definiam a qualificação, o saber ser que passou a marcar o modelo das competências. Assim, enquanto os saberes da qualificação (saber e saber-fazer) são identificados com o conteúdo da formação, o saber da competência (saber ser) se identifica com a mobilização dos demais saberes. Esta é a discussão que se coloca no interior do debate, hoje, sobre a formação em engenharia, que visa como ponto de partida não centrar a formação nos conteúdos presentes nos currículos, mas na capacidade do futuro engenheiro de mobilizar os saberes para responder às situações problemas. O saber ser, contudo, permite uma ampla leitura e mesmo contraditória do que poderia ser.    

2.2.        O Saber Ser

Muito embora a preocupação com a formação humanística não seja nova ou até mesmo seja em muito anterior à resolução do CNE, e pode mesmo ser localizada em Paulo Freire (2009) ao se referir à dimensão humana na formação, ela vai ao encontro do que se convencionou chamar de saber ser ou saberes sociais que ganhou maior visibilidade com a emergência dos debates polarizados e muitas vezes acalorados sobre as competências que têm lugar na academia a partir do final do século passado.

Ao saber e ao saber-fazer, marcas do modelo da qualificação que balizaram a formação profissional durante décadas em grande parte do mundo, acrescenta-se, a partir dos estudos das competências, o saber ser como sendo um saber importante para responder às novas demandas do mundo do trabalho cujos sistemas de produção se desestabilizaram a partir dos anos 1970 com o surgimento de novas tecnologias e novos modelos organizacionais de controle dos processos de produção e do trabalho, inclusive com o choque do petróleo que marcou esta década com importantes repercussões econômicas. E, registre-se, a incapacidade do modelo da qualificação de responder às mudanças em curso, inclusive as sociais (DUGUÉ, 2004).

A flexibilização da produção e das relações de trabalho ocupou, em grande parte, o lugar da rigidez taylorista da produção; a competência ocupou, em grande parte o lugar da rigidez da qualificação, questões que colocaram em xeque os direitos dos trabalhadores duramente conseguidos.

O saber ser na leitura do mundo do capital passou a ser a capacidade do trabalhador de identificar e responder a situações fazendo uso de sua subjetividade, mas evidentemente comprometida com os interesses da produção. A leitura dos trabalhadores vai muito além e reclama a justa remuneração da sua subjetividade aplicada ao trabalho, até então não remunerada, mas, sobretudo, não esvazia o saber ser da sua dimensão humana e social, assim como registra o CNE.

3.    METODOLOGIA

A pesquisa foi realizada durante o 1º semestre de 2018 com 45 discentes do curso da Engenharia Elétrica no Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais, CEFET-MG, matriculados na disciplina “Prática de Estágio Supervisionado”. Como critério de inclusão na pesquisa os discentes deveriam já ter concluído ou estarem no processo de realização do estágio.

Os dados utilizados foram coletados em sala de aula da referida disciplina, quando cada um dos discentes/estagiários apresentou sua prática de estágio. Ao final de cada apresentação eles foram questionados pelos pesquisadores e a cada resposta surgiram novas questões estabelecendo-se um diálogo entre o discente/estagiário e os pesquisadores, mas que teve, também, a participação dos demais colegas da sala de aula. As apresentações, assim como os questionamentos e, portanto, o diálogo que se estabeleceu entre as partes foi gravado pelos pesquisadores cujo total do tempo é de 40 horas.

As gravações permitiram coletar de cada exposição, questionamentos e diálogos, os dados que foram posteriormente agrupados em categorias para compor a compreensão dos autores sobre a presença ou não da formação humanista e crítica que deve, em princípio, fazer parte da formação oferecida pela faculdade de engenharia na atuação dos discentes/estagiários/as?

4.    RESULTADOS E DISCUSSÕES

Os dados coletados não mostram questionamentos ou uma preocupação dos discentes/estagiários no exercício de suas atividades nas empresas onde realizam o estágio com questões de ordem humanista, de compromisso ou responsabilidade frente ao social e ao meio ambiente.

O estágio representa para eles a oportunidade de aprimoramento dos conteúdos teóricos adquiridos na universidade não sendo relevante para o aprofundamento do caráter transversal do eixo da engenharia na sua formação humanista e critica.

Não se observou, portanto, questionamentos sobre o compromisso da engenharia com a transformação social.

Uma ausência de comportamento crítico, neste sentido, é registrada, o que não significa que não exista, mas tão simplesmente que não foi observado durante a pesquisa. Os discentes/estagiários centraram suas exposições muito mais no caráter técnico do trabalho desenvolvido nas empresas, o que, de alguma forma, vai de par com a pesquisa de Boina, 2011, que mostra que a formação deles está mais centrada nos aspectos técnicos em detrimento da humana e social. O comportamento crítico, ainda que não se possa determinar em que espaços sociais e humanos foi construído, existe, sim, mas sugere ser seletivo.

Assim, críticas dos discentes/estagiários recaem de forma bastante contundente sobre a faculdade e seus professores e isso se dá porque eles fazem uma comparação imediata entre o que ensina a faculdade, ou o que se encontra na sua grade curricular, e o que demanda o mercado de trabalho.

Eles consideraram que o conhecimento teórico/técnico adquirido no curso de engenharia é, em muitos aspectos, insuficiente para desenvolver as atividades demandadas pelas empresas e creditam essa insuficiência ao fato da faculdade focar muito mais nas pesquisas acadêmicas do que propriamente nas demandas do mercado de trabalho:

O CEFET-MG já foi referência no mercado de trabalho por fazer uma conexão direta entre a teoria e a prática. Hoje a Instituição está quase totalmente voltada à pesquisa e já não mais atribui vantagens aos alunos em relação aos de outras faculdades, em termos de preparação para o mercado de trabalho. (ALUNO 9, 24 anos)

Insistindo nas críticas, foi recorrente na fala dos discentes/estagiários que não existe uma efetiva comunicação entre o que é ensinado no CEFET-MG e a demanda do mercado de trabalho.

[...] acredito que especializações são necessárias para o mercado de trabalho. O curso deixa a desejar em alguns eixos da engenharia. Acredito que algumas disciplinas ofertadas como optativas e em semestres alternados fizeram falta. (ALUNO 2, 22 anos)

Eles reclamam que as disciplinas oferecidas pelo curso estão muitas vezes desatualizadas em relação às demandas do mercado de trabalho e propõem, por exemplo, “Ofertar optativas atualizadas com o mercado, laboratórios com mais foco nas práticas...” (ALUNA10, 28 anos).

As críticas são direcionadas para a falta de disciplinas que lhes proporcionariam uma melhor empregabilidade e um diferencial para inserção no mercado de trabalho. Na visão dos discentes/estagiários o currículo do curso deveria se adaptar segundo a ótica do perfil profissional exigido pelo mercado de trabalho.

O currículo de disciplinas obrigatórias deveria ser mais objetivo e restrito ao essencial que todo engenheiro eletricista deve saber. A carga horária obrigatória atual impossibilita a realização de estágio em harmonia com o curso: atualmente se escolhe entre formar ou estagiar, contrário à proposta do CEFET-MG de introduzir os alunos no mercado de trabalho. (ALUNO 9, 24 anos)

Ao se reportarem ao que as empresas esperam deles, eles ressaltam um sólido conhecimento técnico, capacidade de trabalhar em equipe, flexibilidade e iniciativa.

Eles creditam ao estágio a melhoria de suas habilidades pessoais, tais como: autoconfiança, autonomia, proatividade, agilidade, manter boas relações interpessoais. Afirmam, entretanto, que muitas dessas habilidades foram desenvolvidas durante o curso e são essenciais para a realização das atividades de estágio, contribuindo assim para uma melhor formação acadêmica profissional.

Foram desenvolvidos ao longo do curso comportamentos relacionados à disciplina e à organização na realização de tarefas, bem como a "autossuficiência" e a proatividade para resolução de problemas. (ALUNA 3, 24 anos)

Muito embora os discentes/estagiários considerem que as habilidades desenvolvidas durante o curso foram importantes para sua formação profissional, eles denunciam a forma bastante constrangedora utilizada por professores e pela Instituição no desenvolvimento dessas habilidades. Questionado sobre as implicações desse constrangimento, um discente/estagiário de 22 anos responde: “desespero e sobrecarga emocional”. No relato abaixo ele afirma que os professores fazem “terrorismo”:

Os professores devem parar com o "terrorismo" que fazem. Devem perceber que nem sempre o aluno quer se tornar um pesquisador, como eles gostam de impor. (ALUNO 4, 22 anos)

Se os discentes/estagiários, na sua maioria, se consideram aptos a realizar sozinho as atividades propostas pela empresa, se consideram proativos, organizados, autônomos ou possuírem outras habilidades que poderiam levar a empresa a vê-los como competentes, isto se deve, em grande medida e no entendimento deles, à não existência de uma boa interação entre o CEFET-MG, os professores e os estudantes: 

Acho que o curso é mais puxado do que deveria. O ambiente de pressão acaba promovendo alguns comportamentos positivos, mas de uma maneira pouco saudável. O trabalho em grupo geralmente sobrecarrega alguns e o apoio de colegas adiantados é essencial devido à baixa disponibilidade de professores. A proatividade vem de forma extenuante com a média de 10 disciplinas por semestre. (ALUNA 4, 28 anos)

As habilidades que acreditam possuir podem ter sido construídas na necessidade de resolver os problemas do cotidiano sozinhos (MEIRIEU, 1998). Eles relatam não ter qualquer acompanhamento ou apoio dos professores frente às situações imprevisíveis do cotidiano do mundo do trabalho, o que os obriga, muitas vezes, a recorrer aos colegas para resolver situações difíceis que encontram no estágio. Em relação ao CEFET-MG eles declaram se sentir abandonados, aumentando assim a sensação de ansiedade e insatisfação com o curso.

A questão de relacionamento entre aluno e professor, e também a burocracia do departamento desgastam muito o aluno, principalmente sobre horário de aulas. (Aluna 5, 23 anos)

5.    CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os relatos dos discentes/estagiários pesquisados expressam muito fortemente a ideia de que cabe à faculdade formar o aluno para o mercado, atendendo prioritariamente aos interesses da empresa (competitividade e crescimento) e deles próprios (empregabilidade e mobilidade profissional).

As preocupações humanas, sociais e com o meio ambiente não foram expostas por eles, o que não significa que não existam. Observa-se, contudo, que eles compartilham os valores do mercado e a realidade social lhes parece distante e naturalizada.

Muito possivelmente o esforço da Instituição no sentido de uma formação humanista e crítica, capacitando o engenheiro a identificar e a resolver problemas, visando atender às demandas da sociedade não tem sido suficiente, mesmo porque, como observa BOINA (2011), as disciplinas da área de humanas que se encontram na grade curricular de formação dos engenheiros do CEFET-MG não recebem da Instituição a mesma atenção que as disciplinas técnicas. Neste sentido, os discentes/estagiários relataram não verem no CEFET-MG incentivos para identificar e resolver problemas inerentes às demandas da sociedade. A relação dos professores com os alunos, como afirmam, é também de pouca ou de nenhuma ajuda nesse sentido.
Vale recorrer aos estudos sobre a qualificação e as competências (ZARIFIAN, 1999; FLEURY; FLEURY, 2000; LE BOTERF, 2004; TOMASI, 2004) para lembrar que as críticas que fazem os discentes/estagiários da não coincidência das disciplinas técnicas oferecidas pelo curso com os saberes demandados pelo mercado têm mais sentido no modelo das qualificações, que procura aplicar linearmente esses saberes ao posto de trabalho, do que no modelo das competências, que, diferentemente, implica a mobilização destes saberes. A faculdade e seus professores, ao se considerar as críticas por outro ângulo, parecem não desenvolver qualquer esforço no sentido de ajudar os alunos a mobilizar os seus saberes, que, abandonados, como afirmam, devem contar apenas com eles e com os colegas para desenvolver suas competências, ainda que sejam elas muito mais identificadas com os interesses do mercado do que deles próprios enquanto cidadãos e da sociedade.
REFERÊNCIAS
BACHELARD, G. A formação do espírito científico: contribuição para uma psicanálise do conhecimento. Rio de Janeiro: Contraponto, 1996.
BOINA, C.M. O ensino de sociologia nos cursos de engenharia. Dissertação de mestrado. Centro Federal de educação Tecnológica de Minas Gerais - CEFET-MG, 2011.
FLEURY, A.C.C.; FLEURY, M.T.L. Estratégias empresariais e formação de competências. São Paulo: Atlas, 2000
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa (39a. edição). São Paulo: Ed. Paz e Terra, 2009.
LE BOTERF, G. Construire les compétences: individuelles et collectives. (3a. edição). Paris, Éditions d'Organisation, 2004.

MEIRIEU, P. Aprender... sim, mas como? Porto Alegre: Ed. Aartes Médicas, 1998.

TOMASI, A. (Org.). Da qualificação à competência: Pensando o Século XXI. Campinas-SP: Ed. Papirus, 2004.

ZARIFIAN, P. CHATZIS. K; CONINCK, F. L'accord A. Cap 2000; la "logique compétence" à l'èpreuve des faits. Travail et emploi 3 (64), 1995: p.35-47.

ZARIFIAN, P. Objectif compétence. Paris: Éditions Liaisons, 1999.













[1] Psicólogo e sociólogo do trabalho, professor titular do Centro Federal de Educação Tecnológica do CEFET-MG (Departamento de Engenharia Elétrica/Programa de Pós-graduação em Educação Tecnológica do CEFET-MG)
[2] Engenheira mecânica, mestre em Educação Tecnológica pelo CEFET-MG e doutoranda em Educação pela UFMG.
[3] Psicóloga e mestranda em Educação Tecnológica pelo CEFET-MG.

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